Ontem alguém "vazou" a carta que o Vice-Presidente Michel Temer escreveu para a Presidente Dilma Rousseff e vemos nela, claramente, que o nosso Vice já está se articulando para tentar assumir o Planalto. Nela ele expõe uma insatisfação com o tratamento que recebe da Presidente, ou melhor, do tratamento que não recebe. Suas críticas devem ter fundamento porque, ao que me consta, o Planalto não desmentiu, rebateu ou se justificou o conteúdo da carta. Pelo contrário, tenta passar a nós cidadãos, via sempre com os mesmos jornalistas e blogueiros, que Temer não passa de um traidor, como se uma pessoa não pudesse mudar de lado por não concordar com isto ou aquilo.
O projeto de poder instaurado pelo atual governo, parece não permitir que se discorde ou que se critique seus atos. Todos os indicadores mostram que estamos em época de recessão e, pelos motivos ocultos de sempre, alguns continuam a querer maquiar as coisas querendo que acreditemos que está tudo bem. É uma pena que alguns caiam na "lábia" destes (que devem ganhar alguma coisa), e não abram seus horizontes para fazer seu próprio juízo de tudo que está acontecendo. Temer não é santo, muito menos o "salvador da pátria", mas estamos numa situação, que o país precisa de credibilidade, precisa que as pessoas, principalmente os investidores, voltem a confiar no Brasil. Hoje não temos esta confiança, imagine você que lê este artigo... você depositaria seu dinheiro em um banco que estivesse sob algum temor de inadimplência? Ou que não garantiria que seu dinheiro pudesse render o combinado e quando você fosse sacá-lo, retiraria menos do que depositou? É facil a resposta e eu imagino que é exatamente isso que passa na cabeça daqueles que procuram os mercados emergentes para investir seu dinheiro. O impeachment não é a melhor solução, muito melhor seria a digna renúncia da Presidente, ou uma cassação conjunta da chapa Dilma/Temer, como propôs a Rede Sustentabilidade, porém o ego, o orgulho de não admitir seus erros, (talvês o medo de enfrentar a justiça...) ou o apego pelo poder, façam com que seus atos vislumbrem a causa própria ao invés de buscarem o melhor para o País. Ao olharmos para a história, nas grandes democracias e corporações, sempre que surge um fato que possa macular a imagem de uma grande empresa ou mesmo de um país, seu principal governante toma como primeira atitude, sua renúncia, para que as apurações dos fatos sejam as mais transparentes possíveis, e suas consequências sejam menos dolorozas e tenham o menor tempo possivel. Nossos governantes poderiam ser patriotas agindo desta maneira.
Sonhar... como é bom sonhar.
Abaixo a carta do Vice-Presidente:
São Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.
Senhora Presidente,
"Verba volant, scripta manent" (As palavras voam, os escritos permanecem)
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos.
Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.
Basta ressaltar que na última convenção apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o candidato à reeleição à Vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido. Isso tudo não gerou confiança em mim. Gera desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
1. Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.
3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.
4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas "desfeitas", culminando com o que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta "conspiração".
5. Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.
6. De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.
7. Democrata que sou, converso, sim, senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.
8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden - com quem construí boa amizade - sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da "espionagem" americana, quando as conversar começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança;
9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma conexão com o teor da conversa.
10. Até o programa "Uma Ponte para o Futuro", aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal.
11. PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.
Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.
Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção.
Respeitosamente,
\ L TEMER
A Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
DO. Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto